Atenção, portas se abrindo para a música de Zanna
O som que chega a caixas ou fones de ouvido é coisa rara e ousada nesses tempos de tanta música previsível. Novas canções, de admirável frescor, mesmo que inseridas na sofisticada tradição da já clássica MPB. São sambas, bossas, baladas tocados por especialistas que, estimulados pelo conteúdo do repertório, se jogam com a desejada mescla de puro tesão e técnica impecável. Zona de conforto, ideal para quem sonha e quer voar alto como Zanna, a cantora e autora de todas as músicas do álbum.
Para concretizá-lo, ela procurou a expertise de Moogie Canazio, produtor e engenheiro de som radicado há três décadas e meia na Califórnia, mas, sempre na ponta-aérea com a música feita no Brasil. Assim, entre estúdios do Rio (Visom Digital) e Los Angeles (East West), alternando alguns dos melhores instrumentistas em atividade nos dois pedaços, Zanna registrou este que entende como seu primeiro disco.
Autora de letra e música das 11 canções - com exceção de “Bonecos reis”, em parceria com Renato Greco -, Zanna domina os fundamentos de sua arte. Como compositora e também como a pessoal intérprete: voz (e coro) e violão que imprimem a pulsação e o espírito que guiam seus companheiros de viagem. No Rio ou em LA, na gravação dos arranjos de base criados por Zanna e Moogie alternaram-se , entre outros, Jorge Helder (contrabaixo), Marcelo Costa (percussão), Rodrigo Sha (flauta e clarinete), Jorjão Barreto (piano e Fender Rhodes), Guto Wirtti (baixo), Iura Ranevski (violoncelo), André Vasconcelos (baixo) e Marlon Sette (trombone). Cinco canções também ganharam arranjos de orquestra e regência de Eduardo Souto Neto (“Vento praia nordeste”, “Inverno”, “L’amore", “Se" e “Esquecida”); enquanto outro craque no tratamento de cordas e metais, Rildo Hora, assina o arranjo e rege a orquestra do samba “Bonecos reis”.
Cenas e sacadas do cotidiano, lembranças de lugares e pessoas, amor e desamor estão entre os temas das letras. A bossa-novista “Inverno”, com levada e arranjo que remete aos grandes encontros de João Gilberto & Claus Ogerman & Tom Jobim, mais um jazzístico solo de flugelhorn (Dan Fornero), resume numa frase um dos poderes da arte: “…eu deixo essa dor nessa canção pra ser feliz”. Composta no fim dos anos 1990, quando Zanna vivia na Itália, é música que também traduz o sentimento da saudade (a palavra que filólogos dizem só existir na língua portuguesa).
A mesma atmosfera de uma bossa-jazzy aconchegante envolve faixas como “Vento praia nordeste” (que abre o disco com leveza, aquarela pintada em versos e sons de um verão de chuva e sol, este realçado no solo do gaitista Milton Guedes), “Se” (com os especiais vocalises de Claudio Nucci), “Esquecida” e “L ‘amore" (esta, cantada em italiano, é outra que nos leva a João Gilberto, em sua breve incursão pelo mesmo idioma e a revelação e inspiração que “Estate" foi para tantos).
Na paleta sonora do disco ainda cabe mais sambas, com um pé na gafieira (“Bonecos reis”) ou no bolero pop (“Quintal”); e também bossas-pop, em diferentes teores. Seja com um sopro mariachi (“Eu”, graças ao trompete de Ramon Flores), com pegada entre a ciranda e o maracatu (“Alice”), toada de sabor nordestino (“Menina de vento”, com o acordeom de Bebê Kramer e a viola de 12 cordas de Jaime Alem) ou essencialmente bossa-novista (“Deixa”, com os deliciosos vocalises cheios de "badabadás" de Zanna).
A faixa mais pop, no entanto, não é listada na capa: “Babe" (nesta, acompanhada apenas pela guitarra de Rafael Moreira) entra após três minutos de silêncio da última: "Eu não sou de Ipanema, mas eu tenho meu sistema solar / eu quero estar de bem com a vida e o meu babe pra me acompanhar”.
Mais um autorretrato, funcionando também como uma despedida ou um até breve de Zanna e sua estreia pra valer.
Trata-se de meia verdade, mas, agora, apresentando Zanna por inteiro. Afinal, uma década e meia antes, essa carioca lançou outro CD, dividindo o crédito com uma banda fictícia (os Eletrons), quando o instrumental veio em grande parte das mãos do tecladista e multitalentoso Carlos Trilha.
Na época, Zanna já tinha bastante quilometragem na estrada dos sons organizados em melodia, ritmo, harmonia e poesia. Uma paixão que começou na infância da então Rozana Bruno, uma dos cinco filhos de mãe separada, criada em Jacarepaguá, Zona Oeste carioca, onde, aos 7 anos, começou a estudar flauta. Período no qual, como lembra, a música fazia parte do currículo de escolas públicas, e que a levou em seguida a ter aulas de violão (aos 11) e canto (aos 14). Fundamentos que, aliados ao tal do talento, a partir dos 16, garantiram a subida aos palcos para tocar “música de outros” - num leque que ia de Noel Rosa a Manoel de Falla.
Aos 18 anos, recém inscrita numa escola de música, ela percebeu que o ritmo seria vagaroso demais para quem já avançara tanto por conta própria. Trocou o fusca que comprara com seu trabalho na noite por uma passagem para a Itália de seus ancestrais e prosseguiu em sua trilha. Nessa universidade da vida, um período com o Bossa Nostra, grupo italiano de fusão pop, jazz e bossa , funcionou como um curso de mestrado. Usando o nome artístico de Bruna Loppez, se juntou a eles no fim dos anos 1990, como cantora e também compositora - uma de suas canções no período, “Inverno”, gravada com o grupo no disco “Kharmalion”, de 1999, volta agora, com sabor de nova, atemporal que sempre foi. Com o Bossa Nostra Zanna também rodou o mundo, tocando em casas noturnas e festivais, incluindo o Festival de Jazz de Montreux, em noite que dividiu o palco com Herbie Hancock.
Após essa experiência, aconteceu a primeira tentativa de voltar ao Brasil com sua música, o tal disco com os Eletrons, lançado em 2003, e que não aconteceu. Motivo para voltar à estrada, destino Nova York, para mais cinco anos de experiências, estudos e trabalhos. Dessa vez, avançando mais fundo nas artes e nas técnicas de produção e estúdio, incluindo o criação de trilhas sonoras para ambientes. Começava a nascer a compositora, produtora que, à frente da agência zanna, introduziu no Brasil, e na América Latina em geral, o conceito de branding musical. Atividade pioneira e de sucesso imediato - uma googleada conta bem essa parte da história -, incluindo como carro-chefe a voz e o som ambiente das estações e dos trens do metrô do Rio. Tão familiar para cariocas e visitantes da cidade, mas até então anônima, agora, a voz do metrô mostra a sua cara tão musical. Atenção, corações e mentes se abrindo para Zanna.
Antônio Carlos Miguel
(Jornalista Especializado em música há quatro décadas, é membro votante Grammy Latino, do conselho do Prêmio da Música Brasileira e mantém uma coluna no site G1)
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